A audiência virtual vem se tornando uma realidade cada vez mais presente. A pandemia do novo coronavírus gerou a necessidade de isolamento social e restrições no funcionamento do Poder Judiciário, ocasionando a busca de novas soluções para a continuidade e celeridade dos processos.
Além do trabalho remoto dos servidores públicos, uma outra saída para a não estagnação dos problemas levados ao Judiciário Trabalhista foi a implantação de audiências e sessões de julgamento por meio de videoconferência.
A medida não é unânime e vem causando cada vez mais discussões sobre sua validade.
É inegável a necessidade de celeridade dos processos, e a audiência de instrução virtual pode ser uma aliada. Propicia conforto, economia de tempo e menor custo para todos os participantes, eis que não haverá necessidade de deslocamento até a Vara do Trabalho. Ademais, provavelmente reduzirá a aplicação das “punições” processuais (arquivamento do processo, confissão, revelia etc.) ocasionadas vez ou outra quando alguma das partes ou testemunhas não conseguem chegar a tempo até o local da audiência física.
Também há um aumento na celeridade do processo, eis que com a audiência virtual a testemunha pode ser ouvida de qualquer ponto do planeta onde haja conexão estável de internet, evitando-se o tempo despendido com cartas precatórias (oitiva de testemunha que mora em outra cidade) e de rogatórias (oitiva de testemunha que mora em outro país).
Entretanto, há questões que devem ser analisadas.
Há um grande risco de possível manipulação ou de influência nos depoimentos.
Numa audiência convencional, os depoentes estão frente a frente com o magistrado que fica atento a tudo, inclusive se o depoente olha para alguma das partes ou para o advogado, esperando inocente ou inconscientemente uma ajuda para a resposta a uma pergunta importante para o deslinde da ação.
Não podemos esquecer dos cuidados que devem ser tomados ao colher os depoimentos de uma testemunha. Os artigos 456 do CPC e 824 da CLT, tratam determinam que:
CPC – Art. 456 – O juiz inquirirá as testemunhas separada e sucessivamente, primeiro as do autor e depois as do réu, e providenciará para que uma não ouça o depoimento das outras.
(grifos nossos)
CLT – Art. 824 – O juiz ou presidente providenciará para que o depoimento de uma testemunha não seja ouvido pelas demais que tenham de depor no processo.
(grifos nossos)
Na audiência de instrução virtual, isso não é possível. Não há como o juiz “fiscalizar” se alguma parte ou testemunha está recebendo alguma orientação no momento de seu depoimento. Não há como saber se uma testemunha que ainda não foi ouvida está escutando ou tendo acesso ao depoimento do reclamante, ou do reclamado ou até mesmo de outra testemunha, de modo a se preparar para o seu depoimento.
É claro que devemos partir do princípio de que todos os participantes atuarão com boa-fé, mas não podemos negar a possibilidade de fraude.
Outro ponto que merece reflexão é o risco de queda de conexão, o que não é incomum, e que não são todos que possuem uma conexão estável de internet e um equipamento mínimo para a realização da audiência. E mais, muitas pessoas não têm conhecimentos necessários para utilizar as ferramentas tecnológicas.
De acordo com uma análise publicada em 2019 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mais de 90% das pessoas nas classes A e B são usuárias da internet. Nas classes D e E, apenas 42%. Também há uma diferença entre áreas urbanas e rurais. Mais de 70% dos moradores das cidades fazem uso da internet, contra 44% nas áreas rurais. (Instituição de Pesquisa Econômica Aplicada)
Tais problemas não podem ser ignorados, pois ferem os princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa, previstos no inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal, podendo ocasionar a nulidade de atos processuais.
O fato é que, embora boa parte do Judiciário venha prorrogando a realização da audiência de instrução por videoconferência, essa tendência vem crescendo a cada dia diante da necessidade de continuidade e celeridade dos processos.
Assim, diante das questões indicadas acima, no nosso sentir, a realização da audiência trabalhista de instrução de forma virtual deve ser facultativa e contar com a concordância de todos os envolvidos, ou essa ânsia ou necessidade de celeridade poderá dar de nulidade a atos processuais, com efeitos contrários, a contemporizar e deixar mais moroso o andamento processual.